Qual a solução para acabar com as práticas atuais dos videojogos?

Se esperam que este artigo dê a resposta desenganem-se. Aqui colocam-se hipóteses e abre-se a discussão. Mas a solução essa não é fácil de se chegar!

Os custos de desenvolvimento dos videojogos não param de crescer. E as empresas procuram novas formas de aumentar as receitas para cobrir os mesmos, sendo que os riscos de um jogo dar prejuízo, dados os altos orçamentos, são cada vez maiores. Qual a solução para o problema?

Bem, tal como as grandes produções de Hollywood, os jogos são cada vez mais caros de se produzir. Tal implica que estes jogos necessitam de maiores volumes de venda para cobrirem os custos, e implica igualmente que o produtor necessita de incluir meios de monetização adicional para cobrir a possibilidade de as vendas não alcançarem os valores necessários.

Este é um dos problemas atuais que está a assolar a industria, até porque as formas de monetização acabam por ser baseadas no pay-to-win, ou na venda de loot boxes, de conteúdo aleatório, e que não se limitam a criar a receita, mas acrescentam um fator de aleatoriedade que faz com que a venda possa não ser efectiva, levando o consumidor a jogar novamente na mesma.

A comissão de jogo do Reino Unido, ao contrário das de outros países, achou que as loot boxes não são jogo uma vez que não há a possibilidade de o cliente ganhar dinheiro. E efectivamente temos de concordar parcialmente com esta ideia! Tal não é muito diferente de se comprar uma rifa na feira, e tentar a nossa sorte na saida de prémios não monetários!



A questão aqui é que há diferenças entre os dois casos e esse é o motivo porque não concordamos totalmente. Na feira a pessoa joga tentada pelos prémios, e nada mais. Mas nos jogos, a pessoa já pagou 70 euros pelo produto, e o que está a desbloquear é conteúdo que é seu… conteúdo pago, mas que lhe está inacessível. Seria o mesmo que na feira a pessoa pagar o custo dos prémios que pode obter antes de jogar. Mas depois ter de jogar até estes lhe saírem, sendo que o sorteio é sempre aleatório, e as probabilidades por norma não aumentam ao serem retiradas da equação os prémios já entregues e as rifas gastas.

Outra das diferenças aqui é que na feira joga quem quer… mas no jogo quem o comprou, é porque quer jogar! E quando não consegue desbloquear os itens pois o jogo está feito para ser extremamente difícil e moroso, o investimento aparece como a solução fácil. É um viciar da realidade do jogo criado com um único intuito, o incentivar a gastar dinheiro! Este é o motivo pelo qual a Comissão de jogo Belga, após a polémica de Battlefront, se pronunciou contra as loot boxes pagas e refere que vai levar a situação ao Parlamento Europeu para as ver banida da Europa. E o mesmo se passou com a Comissão do estado do Havaí que pensa da mesma maneira. Do lado Francês um senador já pediu igual intervenção das autoridades de jogo do seu País.

Esta é a nosso ver, e quando aplicada de forma que não seja meramente opcional, uma prática abominável pois a mesma distorce a realidade dos jogos. Pague-se ou não, a dificuldade e o tempo necessário dedicar-se ao jogo é superior ao que existiria sem estas práticas, e a maior parte das pessoas que não investe acaba por largar o jogo sem desfrutar de tudo pelo qual pagou no ato de compra. Dê lá por onde der, a viciação à liberdade e realidade do jogo é sempre feita criando o hábito e normalidade do vício do jogo a dinheiro (gambling).

Esta é uma prática suja que necessita de desaparecer… mas uma prática que garante elevadas receitas e a compensação quase garantida com vendas menores. No entanto, a realidade é que nem por isso nos jogos que vendem mais e cobrem as despesas, dando lucros, estas práticas são removidas ou atenuadas. Clash Royale por exemplo já se pagou milhões de vezes, e mesmo assim é um dos exemplos supremos do Pay-to-win do mercado. Referimos este jogo de smartphone como exemplo pois ele representa o pior deste tipo de situações, onde tudo, mas absolutamente tudo que existe naquele jogo está feito com o intuito de criar no utilizador a vontade de se gastar dinheiro.

Mas sem estas situações, o que pode existir que dê iguais garantias aos criadores de software? As vendas de situações meramente cosméticas são alternativas viáveis, mas nelas há apenas um interesse de se tornar a personagem mais atractiva, não a necessidade do gasto para se melhorar o jogo. Naturalmente que o investimento para estes casos é bem inferior!

A venda de DLC é igualmente uma alternativa. Mas todos sabemos no que isso dá! Conteúdo muitas vezes retirado do jogo base, algumas vezes até já existente no jogo base, e divisão da base de utilizadores entre os que possuem o DLC e os que não o possuem, algo que se torna especialmente problemático nos jogos online.



Seja como for, desde que bem feito, o DLC pode representar receitas adicionais.

O que mais? Jogos como serviço? Nestes casos basicamente temos aquilo que conhecemos em jogos como World of Warcraft. As pessoas terão de pagar para poderem jogar! A diferença é que aqui a situação acaba por ser menos penalizadora que em WOW uma vez que as expansões e melhorias estarão incluídas no serviço. Basicamente a ideia é manter as pessoas a pagar!

A questão é que este tipo de jogos não agrada a todos! E muito menos é algo que se torna atractivo para jovens que requerem que sejam os seus pais a pagar o serviço! Isto claro, acreditando que a pessoa está interessada em manter-se meses e meses a fio no mesmo jogo quando há sempre novos jogos a sair. Há quem o faça, é inegável, mas será que isso era algo viável se todos os jogos usassem esta prática? Pagariam em todos os jogos? Claro que não! Basicamente iriam optar, e jogos que de outra forma até jogariam, devido a esta situação ficariam de fora!

Qual a alternativa então? Alguns analistas iluminados defendem que se deve subir o preço dos jogos…ou cobrar de acordo com a duração dos mesmos… mas estão eles bem da cabeça? Um jogo custa 70 euros! Repito… 70 euros! O salário mínimo em Portugal é de 500 euros, muitas pessoas ganham 600 a 700 euros. E isto é o salário bruto! Retirem impostos e paguem as despesas mensais e vejam quanto sobra! Subir os jogos? Isso seria suicídio! Na mais básica das leis do mercado, a da oferta e da procura, com jogos a mais de 70 euros, e dada a atual oferta a queda na procura seria fatal para o mercado podendo levar a um crash do mesmo! Há que haver coerência. Mais caro implica vender menos… não há aqui nenhuma linearidade que permita dizer que tal resultaria, mas a garantia que as vendas desceriam, essa existe.

Quanto à duração… é ridiculo. Onde é que isso acontece? Um filme de 1h é mais barato que um de 3? Um livro de 500 páginas é forçosamente mais barato que um de 400?  Nem comento!



Basicamente a solução, a nosso ver, passa por uma re-estruturação daquilo que é a industria! Fazer o mesmo a que a industria automóvel foi obrigada. Descer custos de produção e perder a ganância aos grandes lucros.

De que falamos? Bem, basta olhar para os relatórios e contas de grandes empresas como a EA ou uma Ubisoft para percebermos que, no balanço global, os lucros são de largos milhões. E o curioso aqui é que são estas empresas que lucram milhões, e não aquelas que andam mais com a corda na garganta, as que mais tomam estas atitudes para aumentar ainda mais os lucros.

Mas curiosamente são tambem estas as empresas que mais podem fazer para descer custos. Porque não só são elas que pagam mais, como são elas que mais equipas e tecnologia possuem que pode ser partilhada.

Por exemplo, a redução de muitos dos salários milionários para valores mais aproximados dos de outras atividades (com eventual aumento dos prémios em caso de boas vendas), redução do tamanho das equipas e a utilização de bases comuns, como motores e middleware podem levar a descidas dos custos. Se for possível descer-se os custos numa determinada percentagem, as vendas necessárias para o lucro podem igualmente descer nessa percentagem.

Titanfall foi criado com uma equipa com 1/3 do tamanho tradicional de uma equipa AAA. E é um AAA!



Bloodborne foi dado como um sucesso ao fim de ter vendido 1 milhão de cópias, revelando que os seus custos de produção foram baixos. E o jogo é um AAA!

Acima de tudo, a partilha de tecnologias e código entre equipas é super relevante e ajuda a descer custos e tempos de desenvolvimento. Isso é algo que as First Party fazem entre si, e um dos motivos pelos quais os jogos AAA destas equipas são sucessos com vendas menores.

A solução perfeita para o problema de superação de custos não existe, e certamente não seremos nós a fornece-la aqui. Mas algo tem de ser feito, e tal não passa forçosamente por extorquir mais dinheiro dos clientes, especialmente usando tácticas de gambling. Qual é essa solução? Não sabemos, mas a discussão sobre o assunto é urgente e necessita de ser feita!

 

 





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