Será o conceito da Lockhart uma boa ideia?

Será que uma consola de nova geração destinada a oferecer a mesma a quem tem apenas TVs 1080p é uma boa ideia? Neste artigo vamos pesar os prós e contras!

Olhando para o conceito da Lockhart, a ideia que pode surgir é que se trata de uma excelente jogada a nível de conquista de mercado.

Criar uma consola, capaz de entrar na nova geração, mas que possui apenas a capacidade gráfica para alimentar TVs 1080p, servindo o mercado destas TVs, e sendo mais barata, soa a algo de extremamente interessante. Afinal, se olharmos para o mercado, a maior parte das Tvs existentes são 1080p ou menos, daí que os 4K, apesar de estarem em crescimento, são ainda um mercado de nicho. E nesse sentido, oferecer uma solução mais económica, que oferece a qualidade de nova geração, mas sem despender performance no cálculo de pixels que pessoas com TVs não 4K nunca veriam, parece uma boa ideia.

Aliás, caso estas consolas trabalhassem numa resolução superior a 1080p (nas não 4K), fazendo downsamplig para 1080p, a qualidade de imagem ficaria ainda superior ao oferecido pelos 1080p nativos, criando-se naturalmente uma espécie de anti-aliasing de alta eficiência.

Uma consola mais acessível garantiria mais vendas e facilidade de penetração no mercado. Independentemente da performance que a consola concorrente pudesse ter, uma consola mais acessível e capaz seria sempre um produto interessante, e certamente venderia bem.



A luta por uma quota de mercado deixaria de passar apenas pelo modelo mais potente, mas igualmente pelo modelo mais barato. E esta situação não parece ter contras…

Ou será que tem?

Segundo o que se tem vindo a referir, os developers dizem que sim.

Aparentemente a maior queixa é a quebra significativa de Ram. Mas neste artigo nem vamos admitir essa situação. Vamos apenas aceitar que a Lockhart está devidamente escalada, e analisar outros possíveis problemas.

Infelizmente, existem uma série de cenários que mostram que um conceito como o da Lockhart poderá não ser algo assim tão bom, e existe mesmo um em que o conceito se poderia mostrar arrasador para a XBox. Vamos ver os vários cenários.

Caso 1 – a Limitação pela consola mais fraca



Existir uma consola menos capaz obriga forçosamente a que os jogos sejam pensados de forma a correr nas duas. Ora elas seriam duas consolas devidamente pensadas para escalar exactamente a mesma coisa, com a mesma qualidade, mas em resoluções diferentes. E tal parece eliminar qualquer problema, especialmente se o CPU for o mesmo (se não for a coisa complica e muito), e a memória e largura de banda adequada igualmente às resoluções e texturas nelas usadas.

Mas esta situação tem um problema. Está a forçar resoluções nas consolas. E a partir do principio que uma correrá a 4K e a outra a 1080p!

Mas a realidade é que se a Microsoft impuser essa limitação e a Sony não fizer o mesmo com a sua PS5, o que poderá acontecer é o aparecimento de jogos na PS5 que tirando partido da totalidade da performance da consola, trabalham com resoluções mais baixas e re-constroem a imagem para os 4K. Teoricamente poderíamos ter um jogo que rendesse nativamente a 1080p, e que com o uso de técnicas de reconstrução avançadas, conseguissem elevar a resolução com elevada qualidade para os 4K.

Tal permitiria usar a performance do GPU no aumento da qualidade gráfica em vez do simples processamento de pixels, e os resultados seriam absolutamente assombrosos a nível do que se poderia obter.

Infelizmente estes jogos nunca poderiam passar para a Xbox, uma vez que caso a Anaconda usasse toda a sua capacidade para render a 1080p, a Lockhart, assumindo o correcto escalamento do hardware pura e simplesmente teria de render a uma resolução 4x inferior, ou seja 960×520. Recorde-se que, comparativamente, isto é menos que as resoluções usada pela Xbox 360 em 2005!



Ora uma coisa é reconstruir uma imagem a partir dos 1080p uma resolução onde a densidade de pixels no ecrã já é elevada, e subir para 4K, mas outra é pegar numa resolução baixa onde a informação presente no ecrã pura e simplesmente não existe e aumentar a mesma.

Vamos ver isso com um exemplo. Vejam a seguinte imagem!

Apesar que a imagem de cima não está a 4K, a imagem original é 4K, e será dela que vamos retirar os extractos que se seguem, obtidos ali na zona assinalada a vermelho.



Esta imagem é então um extrato da imagem de cima, adaptada ao espaço de visualização da PCManias, e que permite ver o nível de informação que é possível conter-se naquele pequeno pedaço da imagem numa TV com resolução 4K.

Seria esta o nível de pormenor que teriam naquele pedacinho de ecrã com uma resolução nativa de 4K.

Vamos ver agora o que teríamos a 1080p. Para isso reduz-se a resolução da imagem total, e retira-se novamente o extracto, re-escalando novamente para a mesma área de ecrã para que se percebam as diferenças. E o resultado é o seguinte:

Como se vê, o nível de pormenor é menor. mas o nível de pormenor para se trabalhar num re-escalamento com novas metodologias é ainda grande. Certamente o resultado nunca seria igual ao original, mas poderia ainda ser surpreendente.



Vejamos agora o que aconteceria se a imagem global fosse 960×512, e que informação haveria neste mesmo pedaço de imagem.

O que temos ali é uma salgalhada de pixels. A informação pura e simplesmente não existe, pelo que se passar de 1080p para 4K poderia permitir resultados supreendentes, aqui a coisa não é tão linear. Porque pura e simplesmente a informação não está lá.

Isto não quer dizer que usando vários fotogramas a coisa não pudesse melhorar, mas a realidade é que o resultado seria sempre sub par, e ao nível da geração anterior.

Para verem com mais detalhe, eis um dos carros ampliados.



4K

Apesar de estarmos a lidar com uma percentagem ridiculamente pequena da imagem global reparem no nível de pormenor que ainda existe no carro. Percebe-se o contorno das rodas, os pilares dos vidros, a grelha frontal, etc.

1080p



A perda de pormenor é gigante. Mas mesmo assim, apesar de com muito menos detalhe, distinguimos as rodas, os pilares e a grelha.

512p

Se alguém consegue perceber que está ali um carro… os meus parabéns pela fértil imaginação!

Caso alguém duvide do que aqui foi feito e queira replicar por si a situação, eis um link para a imagem original. O carro ampliado é o que está à direita do candeeiro no centro da imagem.



Basicamente a ideia a transmitir é que mesmo que a Lockhart usasse IA, ou outra metodologia avançada para a reconstrução da imagem para 1080p, os resultados seriam sempre fracos. Estávamos com algo inferior ao apresentado pela actual geração, e algo que em nada beneficiaria a imagem da consola. Tal obrigaria a que a Lockhart tivesse de render a 1440p o que neste caso já atiraria a resolução para algo mais aceitável na ordem dos 720p.

Seja como for, estarmos em 2025 com ecrãs de 65″ a correr jogos a 720p não parece exactamente algo adequado a uma nova geração. Especialmente quando uma pequena consola de 50 euros a funcionar por streaming poderia oferecer os 4K da Anaconda.

Caso 2 – Uma PS5 de meio de geração

Se a situação de cima já mostra limites ao conceito de Lockhart, o que aconteceria se a Sony lançasse uma PS5 Pro para 8K?

Basicamente a Microsoft ficaria com uma Lockhart numa posição super ingrata. Num jogo onde tanto os 4K como os 8K fossem reconstruidos,  A Microsoft poderia ter de lidar com uma consola que seria forçada a trabalhar em 1080p reconstruidos. Basicamente uma resolução nativa de 2005 para uma consola activa em… 2026



Este cenário seria mau demais para a XBox, o que levaria a Microsoft a provavelmente tornar a Lockhart numa consola de streaming. E isso teria duas consequências:

1 – Basicamente a consola não precisava de ter a potencia que tem e o que se pagou foi em demasia. Ou seja, seria um produto caro para mero Streaming!
2 – A consola mais barata basicamente apresenta uma qualidade muito próxima da mais cara, tornando o dinheiro pago originalmente pela mais cara num desperdício.

Isto parece um bom cenário a alguém?

Caso 3 – O ver os degraus, mas não ver a escadaria.

A ideia da Microsoft com a Lockhart é oferecer uma solução competitiva a nível de preço. Uma consola que possa funcionar tão bem como a mais cara, mas a um preço bem inferior, e trabalhando a resoluções inferiores.



Ora apesar de tal poder parecer uma boa manobra comercial, sabe-se que os criadores de software não estão entusiasmados com a ideia. Para além dos problemas anteriores, o que é mais abordado é a fraca potência da consola. Segundo o que se fala, a consola é, a nível de especificações, comparada a uma PS4 Pro algo melhorada.

Ora aceitando que o CPU, o SSD e a RAM não são prejudicadas, estaríamos a falar apenas de performance gráfica. E sem sabermos quais os ganhos envolvidos, refere-se que este será um GPU de 4Tflops, que apontará aos 1440p, exactamente o mesmo que faz atualmente a PS4 Pro. Mesmo com mais RAM, um SSD e um bom CPU, isto é um prender da consola superior a algo não muito melhor gráficamente que o oferecido pela atual geração

Ora o que nos parece estar a acontecer é que a Microsoft está de tal maneira focada nesses degraus que são a luta pelo inicio da nova geração, que falha em ver que as consolas tem já um longe percurso, que define uma escadaria.

Daí que se coloca a questão:

Como é que a Microsoft vai convencer as pessoas que uma consola de nova geração com menos de 6 Tflops e com especificações semelhantes à PS4 Pro é mais capaz do que a Xbox One X, superior à PS4 Pro, ainda por cima sendo vendida ao mesmo preço ou mais cara que a X?



Repare-se que a Xbox One X está a ser vendida a 350 euros a um ano do lançamento de novas consolas. Daí que mesmo que ela desça para 300 euros 2, 2020, a Lockhart será lançada a um preço que não será inferior. Estamos a falar de um GPU de última geração, de um SSD e de um CPU de topo!

Mas mesmo assim, a nível de capacidade teórica da placa gráfica, estamos a falar de algo inferior à X. Algo que não é capaz de atingir os 4K, quando a X conseguia. Colocando na Lockhart um jogo de atual geração, temos CPU de sobra, temos velocidade de disco acelerada, temos memória de sobra, mas o GPU não tem performance para ir aos 4K nas mesma condições da X. Com retrocompatibilidade de jogos, é um salto para a frente numa mudança de geração, que deixa o pé atrás.

Daí que mesmo que se explique às pessoas que a X não tem Ray Tracing, que a X não tem SSD, que a X não tem tanta RAM, quando alguém compra uma consola que é teoricamente mais potente que a que a sucede certamente vai querer suporte para ela.

A Switch não tem as capacidades gráficas das consolas de mesa… E tem o The Witcher, o DOOM, o Alien Desolation (até melhor que a versão PS4), o Sniper elite 3, e tanto, tantos outros jogos. Daí que mesmo que capada gráficamente o suporte está lá! E se a Switch tem, porque a X, com mais Tflops não pode ter?

Ah… mas a X não tem o CPU da Lockhart. Pois não… nem a Switch tem o CPU da PS4 ou Xbox One… e os jogos estão lá!

Ah, mas a X não tem SSD. Pois não… e a Switch tambem não tem um HDD como a PS4 e a Xbox One… e os jogos estão lá!

Basicamente o que nos quer parecer é que a Microsoft se pode estar a meter por caminhos onde as pessoas não vão perceber o corte de suporte à X. E isto porque a consola que a sucede possui menos capacidade de processamento gráfico que ela, e nem todos os jogos de nova geração usarão mais CPU do que o que X pode oferecer.

Ora todos sabemos que os jogos Switch estão na Switch não porque a Switch seja milagrosa, mas porque a Switch tem performance suficiente para o fazer. Ou seja, não há milagres no CPU e nem no cartão de memória. Basicamente os jogos estão lá porque o CPU e a velocidade de leitura do cartão são suficientes para o que o jogo exige, e nunca levaram as consolas de mesa ao limite nesses parâmetros. Se tal não acontecesse o jogo não estaria lá!

Mas explicar isso às pessoas? Nem todos os jogos da futura geração usarão o novo hardware ao máximo. E se é assim, porque motivo a X não pode ter esses jogos? É mais potente!

Sinceramente não gostava de ser eu a ter de explicar isto a um mercado de massas! Especialmente dado que a ideia da Microsoft é alcançar o mercado PC e nesse mercado ela vai alcançar uma grande variedade de hardware com capacidades diferentes.

Daí que não me admiraria se a Lockhart até viesse a fazer mais cortes do que a mera resolução, e não me admiraria que níveis de detalhe aparecessem nas Xbox de forma a poder livrar o CPU de chamadas de desenho e poder meter os jogos na X.

Ou por outras palavras, uma das consequências da Lockhart poderá ser o tornar a Xbox num PC perdendo o que resta da identidade consola.

Nota final: Naturalmente que não sabemos o que será a Lockhart, ou quais os planos da Microsoft para ela. Na prática a coisa pode nem sequer ser como aqui descrita. O artigo baseia-se em realidades actualmente existentes e não em tecnologias ou técnicas futuras que são nesta fase desconhecidas. Basicamente este é apenas um cenário possível, e baseado naquilo que é a tecnologia actual e que todos conhecemos. Falar para além disso seria especular demais, pois apesar de já sabermos que IA aplicada ao video pode fazer uma reconstrução de imagem de nível superior, duvida-se muito que com resoluções originais tão baixas, a mesma possa fazer milagres! E dado que o Ray Tracing, algo que deverá ser standard na próxima geração, é aplicado à imagem debitada antes de qualquer tipo de processamento de re-construção, a qualidade no resultado final perante uma resolução tão baixa ainda se torna mais complexa de se perceber.

Basicamente o que eu refiro em cima faz certamente parte das queixas que se tem vindo a referir existirem vindas dos criadores de software perante a existência de uma consola como a Lockhart. A mesma vai limitar o que pode ser feito, e isso não é bom nem para quem compra a consola mais barata, nem para quem compra a mais cara, podendo, dependendo do caso, até afectar quem comprar a da concorrência.

 

 



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