Polémica sobre publicidade da Sony anunciando Red Dead Redemption 2 a 4K não tem razão de ser.

Uma publicidade da Sony anunciado RDR2 como correndo a 4K na Pro está a gerar oolémica. Mas o certo é que a publicidade não é minimamente enganadora e o anunciado é efectivamente cumprido. A questão que leva a toda a polémica está na diferença visual para a XBox one X que apresenta 4K nativos calculados todos eles pelo pipeline gráfico tradicional.

Recentemente estalou uma polémica relacionada com uma publicidade da Sony sobre o jogo Red Dead Redemption 2, e que podemos ver na imagem de cima!

A questão passa pelo anuncio do jogo correr a 4K na PS4 Pro, algo que segundo os fans não corresponde à realidade, até porque segundo a Digital Foundry verificou, a resolução usada como base da reconstrução é 1920*2160, não sendo calculados pelo pipeline tradicional todos os 3840*2160 pixels da imagem.

Será que efectivamente, como se refere, há aqui uma tentativa de burla da Sony face aos consumidores? É isso que vamos analisar de seguida:

Durante o filme The Matrix, a personagem Cypher refere:



Eu sei que este bife não existe. Eu sei que quando o ponho na boca, a Matrix está a dizer ao meu cérebro que ele é suculento e delicioso. Após nove anos sabem o que concluo? A ignorância é uma benção.

No enquadramento do filme, basicamente o que este senhor refere é que não adianta ter conhecimento dos factos quando aquilo que se verifica não corresponde à realidade. E nesse aspecto, havendo o interesse nisso, uma vez que a vida fora da Matrix é bem pior que lá dentro, ignorar a realidade pode ser melhor que a reconhecer.

Ora esta frase, de certa forma pode ser aplicada ao presente caso, apesar de não literalmente no mesmo sentido.

Vamos lá a ver.

A verdade da mentira

Quando é que podemos referir que um jogo apresenta uma resolução efectiva/nativa de X ou Y?

A situação é muito complexa, até porque a maior parte das vezes o que temos no ecrã não é o mesmo que se passa internamente!



Para o público em geral, que analisa a coisa de forma simplificada, uma resolução “nativa”, e vamos tomar aqui como exemplo, os 4K, acontece quando o sistema, usando o pipeline de cálculo clássico, calcula e apresenta uma resolução efectiva de 3840*2160.

Mas agora tomemos dois casos em consideração.

No primeiro temos um sistema onde um jogo possui uma resolução de 3840*2160, com o cálculo da luz, das sombras e do ambient oclusion a ocorrer à mesma resolução.

No segundo, temos um outro sistema onde o jogo que apresenta a mesma resolução de 3840*2160, mas o cálculo da luz, sombras e ambiente oclusion ocorre a 1920*1080, sendo apenas a geometria calculada na resolução total.

Estamos perante dois casos onde temos ambos os jogos a 4K nativos ou não?



A realidade é que são casos bem diferentes mas, perante a opinião pública, sim! Basicamente o que conta para as pessoas é a contagem do débito dos pixels. E essa contagem é feita analisando o ecrã e contando os pixels baseando-se na a geometria dos objectos em zonas inclinadas. Isso quer dizer que, apesar de um dos jogos processar basicamente muitas coisas a 1080p, pela geometria estar a 4K, aquilo que pode ser claramente mensurado, o jogo vai ser considerado 4K nativos, tal e qual como o outro.

Basicamente isto mostra a realidade. A ignorância destes factos na análise é, para quem conta pixels, e quem depois fala sobre eles, uma benção. E isto porque se ignora que muito do que está no ecrã está a ser calculado de forma simplificada e re-escalado depois para 4K.

Quando muito, no caso de cima, e numa análise mais cuidada, o que poderíamos ter como referência seria eventualmente uma frase do género:

Efectivamente ambos os sistemas conseguem a proeza de alcançar os 4K nativos, mas comparativamente, a versão Y mostra uma ligeira perda de definição nas sombras face à versão X.

E é este tipo de situação que demonstra a falta de realidade técnica neste tipo de análises. Porque pura e simplesmente, apesar dos mesmos pixels debitados, há diferenças, mas elas não são facilmente visíveis a quem analisa a resolução.

É claramente uma mentira dizer-se que estes jogos são idênticos, mas a realidade é que como não se vê facilmente, ninguém discute. É a questão da verdade da mentira ou da sujidade varrida para debaixo da carpete.



A análise ao presente caso

No presente caso a situação é diferente, porque estamos perante um caso onde, mesmo que tudo seja calculado a 4K efectivos, a saida de pixels recorre à reconstrução de imagem. E isso quer dizer que a contagem de pixels vai contabilizar algo que pode, mais uma vez não corresponder ao realmente calculado. Mas aqui, ao ser mais facilmente visível, é caso para polémica, ao passo que o caso anterior passa despercebido.

Agora questão real é: Será que na publicidade a Sony está a tentar enganar alguém?

A Sony anuncia:

Jogue a 4K numa PS4 Pro. O jogo tem uma saída de 2160p. Tv 4K necessária.

Vamos lá a ver! Cremos que ninguem vai questionar a última frase “TV 4K necessária“. A não ser que algo tenha mudado no momento que estou a escrever este texto, até esta altura, para se jogar a 4K era necessário uma TV 4K. E a PS4 Pro, use reconstrução de imagem ou não, use a resolução toda ou não, nestas TVs tem um output de 4K. Pelo que creio que quanto a esta parte nada há a referir. É uma realidade pura e simples.



Quanto à frase do meio, “O jogo tem uma saída de 2160p”, ela pode ser relativamente polémica, mas se o for, é por pura falta de realidade tecnológica na parte de quem a comenta.

Daí que se torne necessário uma introdução antes de concluirmos para que se perceba bem a coisa.

Se é verdade que na era do HD e Full HD, talvez por uma questão de simplificação, se misturou os termos 720p e 1080p com a associação ao HD (1280*720) e Full HD (1920*1080), a realidade é que 720p e 1080p nunca significaram essas resoluções em particular. Os termos HD e Full HD, quando associados a TVs, esses sim referem-se a essas resoluções. Já os termos 720p e 1080p representam apenas resoluções, cujo número de colunas pode variar, mas constituidas por 720 e 1080 linhas, respectivamente, e apresentadas em modo progressivo. Ou seja, na realidade, incluem, mas não se restringem àquelas!

Como se pode ver isso? Bem, basicamente olhando para as TVs existentes e a forma como elas podem mudar o seu rácio entre a horizontal e vertical. Uma TV só é 1280*720 quando a proporção é 16:9. Se a proporção mudar, por exemplo para 4:3 uma TV 720p será 960*720, mas se for 21:9, mantendo-se em resoluções 720p, ela será 1680*720. E todas estas resoluções são válidas e, neste exemplo, 720p.

Ou seja, lá porque a ideia pública de 2160p é uma resolução de 3840*2160, por ser esta a resolução mais usada nas consolas, na realidade 2160p apenas significa que a resolução apresentada possui 2160 linhas e é feita em modo progressivo, nada referindo quanto ao número de colunas. A simplificação do termo é feita para simplificação, mas não tem validade técnica!



Mas tomando em conta o anteriormente referido, bem como o facto que, segundo a Digital Foundry, a resolução base para a qual são calculados os 4K reconstruidos da PS4 Pro é 1920*2160, as 2160 linhas estão efectivamente lá, e isso quer dizer que a frase do meio não possui qualquer engano ao consumidor, pois apenas no uso simplificado para uso popular da realidade tecnológica, 2160p é associado a uma resolução fixa de 3840*2160. Na realidade aquilo que ele efectivamente significa é uma imagem constituída por 2160 linhas em modo progressivo, e como tal o seu uso está tecnicamente correcto.

Resta-nos a primeira frase: “Jogue a 4K numa PS4 Pro”.

Ora aqui sim, poderemos ver razões para polémica. Vimos que 4K e 2160p são na realidade coisas diferentes, sendo que a primeira, quando associada a TVz diz respeito a efectivamente 3840*2160 (é o número de colunas perto das 4000 (4K) com 2160 linhas que define o termo), ao passo que a segunda, não representa forçosamente essa resolução.

Mas a haver algum engano aqui, a segunda frase então poderia estar a ser tendenciosa! Afinal o termo 4K seguido de 2160p dão efectivamente a entender estarmos em ambos os casos a falar de 3840*2160.

Teremos então de analisar esta primeira frase, e enquadrar a segunda de acordo com o encontrado aqui.



Nativo ou não nativo. Eis a questão.

Para isso temos de encontrar uma forma de definirmos o que se entende como “resolução nativa“, e para isso teremos de entrar numa série de considerações.

Vamos assim encontrar três definições:

Resolução da norma – Esta é a resolução em pixels que a norma define. Não havendo muito a dizer, 4K são 3840*2160, Full HD é 1920*1080.

Resolução da imagem – É a resolução, em pixels, de débito do sistema.



Resolução de processamento – É a resolução de imagem processada pelo sistema informático, e colocada na resolução de imagem final.

As duas definições de baixo requerem mais desenvolvimento, uma vez que surgem associadas, mas podem ser diferentes.

Olhando para o caso de uma Xbox One, esta possui uma resolução de imagem constante de 1920*1080. Mesmo quando o jogo é processado a 1600*900, ou 1280*720, a consola por intermédio de re-escalamento faz um acerto à resolução de processamento para a ajustar com a resolução de saída. Assim o que temos é que a resolução da imagem será coincidente com o Full HD, mas a de processamento pode ser inferior (e aqui vamos considerar que não há simplificação de resoluções nos cálculos de luz, sombras ou outros).

Basicamente ao compararmos estas resoluções com as da norma Full HD poderemos dizer que não estamos perante Full HD quando as três definições não possuem valores idênticos sendo que um deles é inferior ao dessa norma.

Exemplo 1:



Norma Full HD : 1920*1080

Resolução de imagem: 1920*1080

Resolução de cálculo: 1920*1080

Imagem nativa

Exemplo 2:



Norma Full HD : 1920*1080

Resolução de imagem: 1920*1080

Resolução de cálculo: 1600*900

Imagem não nativa

O caso de Red Dead Redemption 2



Vamos ver agora o caso de RDR2 na PS4 Pro para percebermos a dificuldade da situação pelas diferenças para este caso.

A resolução da norma 4K será 3840*2160.

A resolução de imagem é nesta consola para TVs 4K, 3840*2160

Sendo estes valores iguais, ficamos dependentes do último caso: Qual é então a resolução de processamento?

A dificuldade criada pelas reconstruções de imagem é como quantificar essa resolução, pois o que temos é que a consola calcula efectivamente 3840*2160 pixels, e assim sendo apresenta como imagem de resolução de processamento 3840*2160 pixels. No entanto desses, apenas 1920*2160 são calculados pelo pipeline clássico, sendo que outro tanto é calculado por metodologias de reconstrução de imagem. Mas no final, sem qualquer re-escalamento, mas usando processamento bem mais complexo e que toma em conta a movimentação do jogador, a consola acaba por calcular de forma relativamente precisa os 3840*2160 pixels, sendo que, dependendo da metodologia usada na reconstrução, a qualidade final pode ser melhor ou pior, mais perceptível ou menos perceptível face aos 4K todos eles calculados pelo pipeline gráfico.

Se queres perceber melhor as diferenças e como funciona uma das técnicas de reconstrução de imagem da PS4, o checkerboard rendering (não é o usado por este jogo, mas os principios são semelhantes, apesar de os resultados do checkerboard serem superiores), vê este artigo. 

A questão principal a ter-se conta é que, ao contrário do re-escalamento, os pixels obtidos por este método, são calculados tendo em conta a informação do mundo e o movimento do jogador,  apenas não são feitos pelo pipeline clássico, mas de um método mais simplificado!

A implicação é que, mesmo esteja a geometria calculada internamente a 4K, e mesmo que todo o processamento interno esteja a ser feito a 4K, os pixels não sendo todos calculados pelo pipeline clássico e havendo reconstrução, tal permitirá aos contadores de pixels obter  valores que separam a resolução vinda do pipeline clássico da restante. Ou seja, estamos perante o caso contrário do que referimos antes, onde tínhamos a geometria intacta e tudo era processado a menor resolução, mas como a forma como os pixels eram representados permitia medir 4K, dizia-se que estávamos a 4K. Agora a geometria, luz, AO, etc, até podem estar a ser calculadas a 4K, mas como na prática os pixels não são todos calculados da mesma forma, os resultados da medição são diferentes, e a parte que deriva do pipeline clássico e a que não deriva distinguem-se e percebem-se.

Ora comparando com o caso anterior onde o que era calculado com menos resolução não afectava a imagem, naturalmente que esta situação tem mais impacto visual perceptível ao utilizador comum que a outra, e nesse aspecto a razão dos queixosos é inegável.

Mesmo sendo 4K, não estamos perante a mesma coisa que apresenta neste jogo uma Xbox One X onde todo o cálculo de pixels deriva do processamento clássico do pipeline gráfico. Mas por outro lado o facto é que a resolução processada internamente é efectivamente 4K, os resultados é que não possuem a mesma qualidade.

E nesse aspecto, pela definição clássica, estando as três resoluções a bater certo, estamos perante 4K efectivos, ou o que vulgarmente se chama de 4K nativos. Isto apesar que aqui teremos claramente de distinguir a qualidade dos resultados e daí que eu próprio não concordo com o uso do termo e concordando que, mesmo enquadrando-se na definição, os resultados, dependendo da metodologia podem ser bastante diferentes usando reconstrução de imagem nestes métodos usados nesta geração.  É nossa opinião que nesse sentido necessita de ser criado um standard a ser usado para separar estes processamentos de reconstrução dos restantes, algo que a industria não parece muito interessada em fazer.

Mas que 4K, reconstruidos ou não, são 4K… são!

A opinião da industria

Pois bem, ao contrário do que muitos pensam, o que foi escrito até agora não é apenas uma opinião minha. É também a opinião da Sony, e é a opinião igualmente da Microsoft.

Sim, sim… da Microsoft. Não há engano! Basta visitar o Xbox Wire para ver a definição oficial que a Microsoft dá ao termo 4K Ultra HD, visualizado na Xbox One X, e que é bastante extensivo no seu alcançe.

 

 

A game has a 2160p frame buffer output. That includes Native 4K, Checkerboarding, and Dynamic Resolution.

 

 

Como se vê, a definição da Microsoft engloba tudo que possa ter um framebuffer 2160p, e como já vimos, 2160p não é forçosamente 4K. Daí que sejam 4K reais, sejam resoluções não 4K mas com um framebuffer a 2160p, seja uma resolução obtida por Checkerboarding ou sejam resoluções dinâmicas, tudo é incluído aqui.

Está a Microsoft a abusar da definição? Não! Na prática, apenas uma TV 4K tem 2160 linhas, motivo pelo qual nada disto pode efectivamente ser questionado como sendo para 4K. Se precisa de mais do que 1080p, entramos no domínio dos 4K. E a partir do momento em que a industria, pelo menos para já, não pretende definir melhor a coisa, optando por a usar assim, qualquer queixa deixa de fazer sentido.

Mas recorde-se que esta situação de discussão sobre se a resolução tem ou não de vir toda do pipeline clássico não é novidade, e nesse sentido relembro o caso de Killzone ShadowFall que corria no seu modo multijogador a 960*1080 a 60 fps, fazendo reconstrução de imagem para 1920*1080.

Esta situação levou a que fosse colocado um processo contra a Sony em tribunal alegando-se publicidade enganosa. Mas no entanto, apesar de o julgamento ter sido autorizado, o que parece lógico pois claramente o juiz sem ouvir as partes e a componente técnica não saberia ajuizar, acabou tudo com o arquivamento e com o queixoso a ser impedido de voltar a colocar nova queixa sobre esse assunto contra a Sony. Isto porque os argumentos da Sony mostraram exactamente que a consola não deixava de processar a imagem total, apenas não o fazia da maneira clássica, não havendo qualquer mero re-escalamento, mas sim um procedimento que permitia a reconstrução do pixel de acordo com valores calculados que permitem prever o resultado do pixel real que ali  deveria estar. Tal e qual o caso aqui, apesar de a implementação da Rockstar ser claramente inferior!

Daí que não há verdadeiramente aqui alguém com razão. Os queixosos tem toda a razão de se queixar pois o que veem não está com a qualidade do produto 4K da Xbox One X. Mas a Sony não mente pois a resolução processada, mesmo sendo por reconstrução, é efectivamente 4K.

Aliás um caso semelhante a este passa-se com o HDMI 2.1 que está a ser parcialmente implementado no HDMI 2.0, mas no entanto também é chamado de HDMI 2.1. A questão é que quando a industria não consegue a 100% atingir um patamar, então não tem interesse em o definir de forma clara. É marketing, e interessa à industria no seu todo! O resultado é depois um imbróglio que infelizmente deriva da complexidade tecnológica, e que, no presente caso deste artigo, dificultam e muito o uso do termo 4K, mas um que certamente não aconteceria se não existissem paixões tão exacerbadas por parte de quem se queixa.

 

 



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